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O sensei, mestre, era um homem de maneiras calmas respeitado pela comunidade, mas os dois “deshi”, aprendizes, Joco e Boso despertavam suspeitas na aldeia por suas roupas sempre sujas de barro. Da venda dos potes, vasos e utensílios domésticos dependia a sobrevivência do mestre-oleiro e dos aprendizes.
Naquela manhã Joco e Boso estavam surpresos, sensei parecia ter enlouquecido. Em vez de preparar os potes para a queima no habitual processo ordeiro, o mestre misturava os tachos de esmaltes, banhava os potes duas e três vezes, raspava o esmalte, misturava com cinza do forno, ou com barro vermelho, atirava sal nas bordas dos vasos e no lugar do “warabake”, pincel de palha, utilizava uma vassoura de varrer o chão. O mestre terminou seu trabalho e ordenou aos dois ajudantes a começar a arrumação do fomo. Joco e Boso estavam desesperados, perdidos dias e dias de trabalho no tomo. O sensei ficara maluco e não conseguiriam vender nada daquela fornada.
No dia seguinte o mestre mandou acender o forno anagama da forma habitual. Passaram-se dois dias alimentando o fomo de lenha até alcançar a chama branca. Os aprendizes não compreendiam a calma e segurança do mestre e esperaram mais três dias para a abertura do fomo, desmontando a porta fechada por tijolos.
O receio de Joco e Boso estava confirmado: os potes estavam colados nas prateleiras, o vidrado escorrido e irregular, cores lamacentas, secas, sem vida, outros sem esmalte, nada se podia aproveitar. O mestre jogava-os um por um no lixo, onde cada um fazia ruído de quebrado, o qual significava a morte do pote.
Pouco a pouco se formou um monte de cacos. Os dois aprendizes, tristes e desesperados, penetravam mais adentro do anagama passando as peças para o mestre.
Mas, eis a surpresa: lá no fundo do forno, solene, havia um jarro, verdadeira maravilha, de um misterioso e profundo cinza esverdeado, luminoso, com efeitos de cristais, meio tons e borda de milhares de pontinhos dourados brilhando. Joco e Boso ficaram sem palavras, nunca haviam visto uma peça tão bela!
O mestre apanhou o jarro e o contemplou longamente. Virou-se para seus dois aprendizes e
disse: "Boa queima!"
Escrito e desenhado por Daniel Rhodes
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